Introdução: Muitos pais se preocupam quando seus filhos comem pouco e buscam soluções rápidas para aumentar o apetite. Uma dessas soluções tem sido a ciproheptadina, um remédio anti-histamínico (antialérgico) conhecido por causar sonolência e aumentar a fome como efeito colateral. Embora seja vendida em xaropes e fórmulas para "abrir o apetite", é crucial entender que o uso desse medicamento em crianças pode trazer riscos à saúde e nem sempre resolve a causa do problema. Neste artigo, exploramos os principais malefícios da ciproheptadina como estimulante de apetite infantil, comparamos com alternativas mais seguras e apresentamos recomendações de especialistas e dados científicos sobre sua eficácia e segurança.
O que é a ciproheptadina e por que é usada para apetite?
A ciproheptadina é um medicamento anti-histamínico de primeira geração, originalmente usado para alergias. Ela tem ação antisserotoninérgica, ou seja, bloqueia receptores de serotonina, o que pode aumentar a fome. Devido a isso, passou a ser usada off-label (fora da indicação principal) como estimulante do apetite em crianças com dificuldade para se alimentar. Muitos tônicos e xaropes "fortificantes" contêm ciproheptadina associada a vitaminas. Quando a criança toma, geralmente sente mais sono e, em alguns casos, come mais que o habitual. No entanto, esse aumento de apetite é temporário e não trata as causas subjacentes da falta de fome (SciELO Brasil - Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" ). O Comitê de Drogas da Academia Americana de Pediatria inclusive avaliou esses medicamentos e não encontrou eficácia real comprovada para melhorar o ganho de peso a longo prazo (SciELO Brasil - Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" ) – os benefícios muitas vezes não passam de efeito placebo ou resultado de a criança estar em acompanhamento mais atento.
Efeitos adversos da ciproheptadina em crianças
Como todo medicamento, a ciproheptadina pode causar efeitos colaterais, e em crianças eles podem ser bastante incômodos. Entre os principais malefícios estão:
Sonolência e sedação: Por agir nos receptores H1 do cérebro, a ciproheptadina deprime o sistema nervoso central e provoca muita sonolência (20028e-DocCient - Atualiz IntoxAguda por medicamentos.indd). A criança pode ficar apática, dormindo demais durante o dia e com menos energia para brincar ou estudar. Alguns pais relatam que o filho "dorme o dia inteiro" após tomar o xarope, o que pode atrapalhar sua rotina e desenvolvimento.
Efeitos anticolinérgicos: A ciproheptadina, assim como outros anti-histamínicos antigos, tem ação anticolinérgica. Isso significa que pode causar boca seca, prisão de ventre (intestino preso), taquicardia (coração acelerado), visão embaçada e retenção urinária (20028e-DocCient - Atualiz IntoxAguda por medicamentos.indd). Esses sintomas ocorrem porque o remédio não age só no apetite – ele bloqueia outras funções involuntárias do corpo, podendo deixar a criança desconfortável (boca seca, dificuldade para evacuar etc.).
Tonturas e queda de pressão: Em algumas crianças, o remédio causa tontura e sensação de fraqueza. Certos anti-histamínicos podem levar à hipotensão (pressão baixa) ao bloquear receptores adrenérgicos (20028e-DocCient - Atualiz IntoxAguda por medicamentos.indd). Há relatos de crianças que ficam pálidas e indispostas após o uso, justamente por essa queda de pressão e efeito sedativo.
Alterações de humor e comportamento: Nem todas as crianças reagem da mesma forma. Enquanto a maioria fica sonolenta, algumas podem apresentar irritabilidade ou agitação paradoxal (ficam “elétricas”). Também se observa, em uso prolongado, possibilidade de sintomas depressivos ou de ansiedade em função do desequilíbrio de serotonina que o medicamento provoca ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ). Ou seja, interferir quimicamente na regulação do apetite pode também interferir no equilíbrio do humor da criança.
Efeitos neurológicos e no aprendizado: Devido à sedação, o uso contínuo pode prejudicar a concentração e o rendimento escolar da criança. Ela pode se mostrar desatenta, cansada e com reflexos mais lentos. Efeitos neurológicos leves a moderados são frequentes com a ciproheptadina (por exemplo, coordenação motora prejudicada) ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ), afetando a qualidade de vida. Em casos de doses muito altas (intoxicação), podem ocorrer confusão mental, alucinações e convulsões, mas mesmo em doses habituais deve-se ter cautela para não afetar o desenvolvimento neurocognitivo.
Risco de hepatotoxicidade: Um dos efeitos adversos mais sérios, embora raro, é a possibilidade de hepatotoxicidade (toxicidade no fígado) ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ). Foram documentados casos isolados de elevação das enzimas hepáticas em crianças usando ciproheptadina por tempo prolongado, revertendo após a suspensão do medicamento ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ) ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ). Portanto, apesar de incomum (um estudo indicou cerca de 1,4 caso de lesão hepática a cada 1.000 pacientes) ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ), existe sim esse potencial de dano ao fígado, especialmente se usado sem acompanhamento médico adequado.
Possível impacto hormonal no crescimento: Alguns trabalhos científicos sugerem que a ciproheptadina pode interferir nos hormônios de crescimento. Há relatos de que o medicamento pode suprimir a secreção do hormônio do crescimento (GH) em longo prazo, apesar de aumentar o IGF-1 (fator de crescimento ligado ao GH) e promover ganho de peso (Short-term cyproheptadine therapy in underweight children: effects on growth and serum insulin-like growth factor-I - PubMed) (Short-term cyproheptadine therapy in underweight children: effects on growth and serum insulin-like growth factor-I - PubMed). Isso levanta preocupações de que, ao mesmo tempo em que engorda, o uso prolongado pudesse teoricamente atrapalhar o crescimento em estatura da criança. Embora esse efeito não seja totalmente compreendido, ele reforça a necessidade de cautela ao expor crianças em fase de crescimento a esse tipo de fármaco.
Em resumo, a ciproheptadina pode até abrir o apetite da criança temporariamente, mas à custa de vários efeitos colaterais. Sonolência excessiva, boca seca, prisão de ventre, irritabilidade e outros sintomas podem prejudicar mais a qualidade de vida do pequeno do que o possível ganho de peso compensaria. E lembre-se: esses remédios não atacam a raiz do problema – eles apenas mascaram a falta de apetite por um tempo (SciELO Brasil - Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" ), enquanto os efeitos indesejados podem persistir.
Alternativas seguras para estimular o apetite infantil
Diante dos riscos acima, pediatras e especialistas recomendam abordagens não medicamentosas para lidar com a falta de apetite das crianças. É fundamental entender que, em grande parte dos casos, a diminuição do apetite em certas fases da infância é normal e faz parte do desenvolvimento. Por exemplo, entre 2 e 6 anos de idade, muitas crianças comem menos porque o ritmo de crescimento diminui em comparação com os dois primeiros anos de vida (Manual de Orientação - Departamento de Nutrologia). Nessa idade, a criança também está mais interessada em explorar o mundo e brincar do que em comer, o que os especialistas chamam de "anorexia fisiológica" do segundo ano (SciELO Brasil - Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" ). Ou seja, nem sempre a criança que “não come” está doente ou precisa de estimulante – muitas vezes, é apenas uma fase natural. Abaixo listamos algumas alternativas seguras e saudáveis para estimular o apetite e garantir a nutrição dos pequenos:
Respeite a fome e as variações do apetite da criança: O apetite infantil pode variar dia a dia. Em alguns dias a criança terá mais fome, em outros menos, e isso é normal. Não se deve forçar a comer quando ela não quer. A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) orienta respeitar as variações diárias do apetite e não transformar a hora da comida em uma batalha (8569b-Man Pratica Atend) (8569b-Man Pratica Atend). Ofereça os alimentos, mas não obrigue – a criança saudável sabe regular o quanto come de acordo com suas necessidades.
Estabeleça rotinas e ambiente agradável nas refeições: Criar horários fixos para as refeições ajuda o organismo da criança a ter fome naqueles momentos. A SBP recomenda ter horários regulares para alimentação e evitar lanches muito perto das refeições principais (8569b-Man Pratica Atend). Desligue telas (TV, tablet) durante as refeições e sente-se junto com a criança à mesa, dando o exemplo. Um ambiente tranquilo, sem brigas ou pressão, faz a criança associar a comida a algo positivo. Não chantageie ou castigue se ela não comer tudo – isso gera estresse e pode piorar a recusa alimentar (8569b-Man Pratica Atend). Paciência e elogios funcionam melhor que broncas.
Ofereça alimentos nutritivos de forma criativa: Varie o cardápio e apresente os alimentos de forma atrativa. Crianças podem rejeitar algo na primeira oferta, mas aceitam depois de várias tentativas. Incentive a experimentar novos alimentos sem pressão. Corte os legumes e frutas em formatos divertidos, use pratos coloridos. A fase chamada de neofobia alimentar (medo de comidas novas) é comum, mas pode ser superada com persistência. Outra dica é não substituir as refeições por leite, sucos ou lanches pouco nutritivos – se a criança encher a barriga de líquidos ou guloseimas, não terá apetite para a comida de verdade (8569b-Man Pratica Atend) (8569b-Man Pratica Atend). Limite o consumo de refrigerantes, salgadinhos e doces, pois além de pobres em nutrientes, tiram a fome do que importa.
Inclua a criança no preparo e na escolha dos alimentos: Quando possível, leve a criança à feira ou supermercado e fale sobre os alimentos. Deixe que ela ajude em tarefas simples na cozinha, como lavar uma verdura ou montar o próprio prato (com as opções que você disponibilizar). Isso desperta o interesse em comer o que ela mesma preparou. Torne a experiência alimentar algo lúdico e educativo, não uma obrigação.
Verifique causas médicas para a falta de apetite: Antes de tudo, é importante descartar que a inapetência não seja sintoma de algum problema de saúde. Anemia por deficiência de ferro, por exemplo, pode reduzir o apetite, assim como parasitoses intestinais (verminoses) e outras condições. Leve a criança ao pediatra para uma avaliação. Podem ser solicitados exames de sangue (como hemograma para ver anemia) e exame de fezes (para detectar parasitas ou outras alterações) (8569b-Man Pratica Atend). Se houver alguma carência nutricional específica (por exemplo, falta de zinco, ferro, vitaminas do complexo B), o médico irá corrigir com suplementos adequados – isso sim pode melhorar naturalmente o apetite da criança quando necessário (SciELO Brasil - Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" ). Tratar a causa raiz (seja clínica ou comportamental) é sempre melhor do que tentar “tapar o sol com a peneira” usando um estimulante.
Acompanhamento nutricional e comportamental: Em casos de dificuldade alimentar persistente, pode ser útil contar com uma equipe multiprofissional. Nutricionistas, fonoaudiólogos (especialistas em dinâmica de mastigação/deglutição) e psicólogos podem ajudar a criança que tem aversão alimentar ou alguma dificuldade sensorial para comer. Estratégias de food coaching (treinamento alimentar lúdico) e terapia comportamental, aliadas à orientação nutricional, costumam apresentar bons resultados sem necessidade de medicação.
Em suma, as alternativas seguras passam por educação alimentar, paciência e investigação adequada, em vez de recorrer a medicamentos. Vale lembrar uma orientação importante do Ministério da Saúde: “A alimentação complementar deve ser oferecida sem rigidez de horários, respeitando-se sempre a vontade da criança” (Sbp77-2b). Ou seja, até as autoridades de saúde enfatizam o respeito ao apetite natural do pequeno. Com amor, rotina e bom senso, a maioria das crianças consegue ter uma alimentação adequada ao seu ritmo, e aquela fase de pouco apetite é superada sem grandes problemas.
O que dizem os especialistas e órgãos oficiais de saúde?
As entidades de pediatria, tanto no Brasil quanto internacionalmente, não recomendam o uso rotineiro de estimulantes de apetite em crianças saudáveis. As diretrizes enfatizam que primeiro deve-se avaliar e tratar causas orgânicas ou comportamentais da inapetência. Somente em situações muito específicas esses medicamentos podem ser considerados – e sempre com acompanhamento médico.
Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP): A SBP alerta que, na faixa pré-escolar, é comum a redução fisiológica do apetite e os pais muitas vezes interpretam isso como doença (Manual de Orientação - Departamento de Nutrologia). Há casos em que profissionais menos atualizados prescrevem estimulantes do apetite sem real necessidade. A SBP desencoraja essa prática, pois pode acarretar diagnósticos equivocados de anorexia e uso inapropriado de remédios, levando a estresse familiar e até favorecendo obesidade no futuro (Manual de Orientação - Departamento de Nutrologia). Ou seja, forçar a criança a comer (seja com remédio, seja com coerção) pode ensiná-la a ignorar seus próprios sinais de saciedade, aumentando o risco de sobrepeso mais adiante. Em documentos de orientação nutricional, a SBP reforça que medidas educativas e de apoio nutricional devem vir em primeiro lugar, deixando medicamentos orexígenos (que estimulam apetite) apenas para casos excepcionais.
Academia Americana de Pediatria (AAP): A AAP, por meio de seu Comitê de Drogas e outros departamentos, não recomenda estimulantes de apetite para a maioria das crianças com baixo peso ou baixa ingestão alimentar. Conforme citado, a própria AAP não comprovou benefício consistente da ciproheptadina na chamada "failure to thrive" (falha de crescimento) comum, salvo em casos especiais (SciELO Brasil - Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" ). Diretrizes norte-americanas orientam uma avaliação abrangente da criança com dificuldade de ganho de peso, abordando fatores nutricionais, médicos e psicossociais antes de qualquer intervenção farmacológica ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ). Apenas em populações específicas – como crianças com fibrose cística, doença renal crônica ou sob tratamento para câncer – a ciproheptadina pode ser utilizada para estímulo do apetite, pois nesses contextos há evidências de benefício e a inapetência tem causa orgânica definida ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ). Mesmo assim, é um uso criterioso e temporário. “Estimulantes de apetite não são recomendados para a maioria das crianças”, concluem os especialistas ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ). Em vez disso, a AAP sugere acompanhamento nutricional e comportamental, conforme o caso, e reforça que a segurança e efetividade a longo prazo desses medicamentos não estão estabelecidas.
Outras organizações: Sociedades de Nutrologia e Gastroenterologia Pediátrica também ressaltam que o manejo da criança que "não come" deve focar em educação alimentar. Segundo um consenso publicado no Jornal de Pediatria, frequentemente os chamados estimulantes do apetite servem mais para tranquilizar os pais ansiosos do que para realmente tratar a criança (SciELO Brasil - Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" ). Esses autores observam que tais fármacos podem até melhorar momentaneamente a relação mãe-filho na hora da comida (porque a criança sedada fica mais calma e come um pouco mais), mas não resolvem o problema de fundo e seu efeito passa logo (SciELO Brasil - Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme" ). Assim, a orientação é investir em orientação parental, técnicas para aprimorar o comportamento alimentar da criança e, se necessário, suporte psicológico, ao invés de recorrer de imediato a xaropes “milagrosos”.
Em resumo, a comunidade pediátrica desaconselha o uso indiscriminado da ciproheptadina para crianças com pouco apetite. As recomendações oficiais convergem em: avaliar caso a caso, tratar causas identificáveis (mediante exames e consultas), e somente usar medicação estimulante se for absolutamente necessário, por tempo limitado e sob supervisão médica estreita ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ).
Estudos científicos sobre segurança e eficácia
Do ponto de vista científico, o uso da ciproheptadina para estimular apetite infantil já foi avaliado em alguns estudos, com resultados variados. Alguns ensaios clínicos e pesquisas mostram que o medicamento pode levar a ganho de peso em curto prazo em crianças selecionadas, enquanto outros destacam a falta de benefícios duradouros e os potenciais riscos.
Estudo em crianças subnutridas (randomizado e controlado): Uma pesquisa realizada na Tailândia acompanhou 21 crianças abaixo do peso, saudáveis mas com apetite baixo, divididas em dois grupos (ciproheptadina vs. placebo) por 4 meses. Os resultados mostraram que aquelas que receberam ciproheptadina apresentaram ganho de peso e altura significativamente maior do que as do grupo placebo no período (Short-term cyproheptadine therapy in underweight children: effects on growth and serum insulin-like growth factor-I - PubMed). Além disso, houve aumento nos níveis de IGF-1 (fator de crescimento ligado ao hormônio de crescimento), sugerindo melhoria no estado nutricional. Em outras palavras, esse estudo indica que, a curto prazo, a ciproheptadina pode melhorar o crescimento de crianças que realmente precisam ganhar peso. No entanto, os autores também mencionaram que o medicamento tem efeitos sobre hormônios e alertaram para monitorar cuidadosamente seu uso (Short-term cyproheptadine therapy in underweight children: effects on growth and serum insulin-like growth factor-I - PubMed).
Estudo em fibrose cística: Crianças com fibrose cística frequentemente têm dificuldade de ganhar peso devido a problemas de absorção e menor apetite pela doença. Um ensaio clínico randomizado duplo-cego conduzido no Brasil (publicado no Jornal de Pediatria) testou a ciproheptadina em pacientes de 5 a 18 anos com fibrose cística durante 12 semanas. Os resultados foram positivos: o grupo que tomou ciproheptadina ganhou em média 1,61 kg, enquanto o grupo placebo ganhou apenas 0,67 kg no mesmo período (SciELO Brazil - Ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo de ciproheptadina para estímulo do apetite na fibrose cística Ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo de ciproheptadina para estímulo do apetite na fibrose cística ). Houve também aumento significativo no IMC (índice de massa corporal) e no escore Z de peso/idade comparado ao placebo (SciELO Brazil - Ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo de ciproheptadina para estímulo do apetite na fibrose cística Ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo de ciproheptadina para estímulo do apetite na fibrose cística ). Importante destacar que não foram observados efeitos colaterais significativos nesse estudo; os autores relataram que o uso de ciproheptadina foi bem tolerado pelos pacientes, levando a melhora nutricional sem prejudicar a função pulmonar (SciELO Brazil - Ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo de ciproheptadina para estímulo do apetite na fibrose cística Ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo de ciproheptadina para estímulo do apetite na fibrose cística ). A conclusão dos pesquisadores foi de que a ciproheptadina pode ser uma abordagem útil por um curto período para crianças com necessidades nutricionais especiais, como na fibrose cística, sempre pesando risco e benefício (SciELO Brazil - Ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo de ciproheptadina para estímulo do apetite na fibrose cística Ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo de ciproheptadina para estímulo do apetite na fibrose cística ).
Experiência em programa de alimentação (Canadá): Em um estudo observacional realizado em um ambulatório especializado em distúrbios alimentares infantis no Canadá, 82 crianças pequenas com dificuldades para comer foram tratadas com ciproheptadina associada a um acompanhamento multiprofissional intensivo. Os pais de 96% dessas crianças relataram melhora no comportamento alimentar (as crianças passaram a aceitar melhor os alimentos e as refeições ficaram mais tranquilas) (Use of cyproheptadine in young children with feeding difficulties and poor growth in a pediatric feeding program - PubMed). Além disso, houve um aumento significativo no escore de peso para a idade durante o tratamento em comparação aos valores antes do uso do remédio. Os autores concluíram que, em sua experiência, a ciproheptadina, quando usada junto com intervenções nutricionais e comportamentais, foi uma terapia segura e efetiva para bebês e crianças com baixo apetite e dificuldade de ganho de peso (Use of cyproheptadine in young children with feeding difficulties and poor growth in a pediatric feeding program - PubMed) (Use of cyproheptadine in young children with feeding difficulties and poor growth in a pediatric feeding program - PubMed). É importante notar, porém, que esse não era um estudo controlado por placebo – todos os pacientes receberam a intervenção, então não dá para saber quanto do progresso se deveu ao remédio versus às orientações alimentares e acompanhamento próximo.
Revisões e análises de segurança: Uma análise de segurança publicada em 2020 apontou que a ciproheptadina pode ser considerada relativamente segura em termos gerais, quando usada corretamente, mas com ressalvas importantes (Safety of Cyproheptadine, an Orexigenic Drug. Analysis ... - Frontiers). Efeitos neurológicos leves (como já citados: sonolência, agitação, etc.) são frequentes, enquanto efeitos graves, como danos ao fígado, são incomuns ou raros (Safety of Cyproheptadine, an Orexigenic Drug. Analysis ... - Frontiers). Os autores reforçam que deve haver seleção criteriosa dos pacientes para usar essa medicação, monitorando exames como função hepática durante o tratamento, e que tratamentos de primeira linha (como ajustes dietéticos) devem ser preferidos antes de se lançar mão do medicamento ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ) ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ).
Em síntese, as evidências científicas mostram um cenário de curto prazo vs. longo prazo: no curto prazo, e em condições específicas, a ciproheptadina de fato pode fazer a criança ganhar peso e comer melhor. Isso foi observado particularmente em crianças com problemas orgânicos (fibrose cística, doenças crônicas) ou em casos de acompanhamento nutricional bem estruturado. Entretanto, não há evidência de que seu uso crônico e indiscriminado seja seguro ou eficaz para crianças saudáveis que são apenas “ruins de comer” ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ). Pelo contrário, faltam estudos sobre os efeitos a longo prazo e sobre o impacto no desenvolvimento global. Especialistas afirmam que tratar somente o sintoma (falta de apetite) sem uma avaliação detalhada pode ser uma armadilha, pois problemas subjacentes deixam de ser enfrentados ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ). Assim, embora a ciproheptadina tenha seu lugar em situações especiais, ela não deve ser a primeira escolha para a maioria das crianças com apetite diminuído.
Conclusão
O uso da ciproheptadina como estimulante de apetite infantil traz mais malefícios do que benefícios na maioria dos casos. Seus efeitos adversos – desde sonolência intensa, alterações de humor e desconfortos físicos até riscos raros no fígado – podem prejudicar a saúde e o bem-estar da criança. Além disso, o ganho de apetite e peso obtido com o medicamento costuma ser transitório, não resolvendo as causas da falta de apetite e podendo criar uma falsa sensação de solução. As principais entidades pediátricas, como a SBP e a AAP, desencorajam o uso indiscriminado desses estimulantes e orientam que pais e profissionais adotem estratégias mais seguras: avaliar o estado de saúde da criança, melhorar os hábitos alimentares da família, respeitar o ritmo natural do pequeno e usar de criatividade e paciência na introdução de alimentos.
Em última análise, cada criança é única. Se seu filho ou filha está comendo pouco, procure um pediatra para investigar o caso. Na enorme maioria das vezes, não será necessário nenhum “santo remédio” para abrir o apetite – ajustes simples e orientação adequada resolverão o problema de forma muito mais saudável. E nos casos raros em que um estimulante de apetite for considerado, ele deve ser usado com indicação médica clara, por período limitado e acompanhado de perto, pesando sempre riscos e benefícios ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ) ( Off-Label Cyproheptadine in Children and Adolescents: Psychiatric Comorbidities, Interacting Variables, Safety, and Risks of Hepatotoxicity - PMC ). Lembre-se: a saúde infantil se constrói com boas práticas e cuidado, e não há atalhos milagrosos. Garantir uma relação positiva com a comida na infância é o melhor presente que podemos dar para o futuro dessas crianças, evitando medicamentos desnecessários e focando no que realmente importa – um crescimento saudável e feliz.